Regressada no final deste ano de 2021, a Festa do Jazz voltou finalmente à plena normalidade, incluído o Encontro Nacional de Escolas em formato presencial. A Festa do Jazz realizou-se nos dias 18 e 19 de dezembro, em Lisboa, tendo como palco principal o Centro Cultural de Belém; este ano a Festa foi alargada a mais dois espaços: Espaço Espelho D’Água (Encontro de escolas) e Livraria Ler Devagar (Jam sessions). O programa principal dividiu-se em quatro blocos, com concertos duplos: tardes (16h-18h) e noites (21h-23h), no sábado e no domingo.
No sábado, dia 18, a Festa arrancou com a atuação da dupla Leonor Arnaut & Mariana Dionísio – programação de Beatriz Nunes. Dionísio e Arnaut exibiram em palco um trabalho original de duo de vozes, explorando diferentes universos musicais, desde momentos exploratórios até registos quase-operáticos, num diálogo quase perfeito, composto sobretudo por uníssonos; pelo meio, as vozes eram pontuadas com percussões pontuais. Mariana Dionísio e Leonor Arnaut mostraram a qualidade, versatilidade e extensão das suas vozes, num espetáculo que foi absolutamente desafiante.
Seguiu-se o Bock Ensemble, projeto liderado pelo baterista Diogo Alexandre. A acompanhar a bateria de Alexandre estavam João Mortágua (sax soprano e alto), Tomás Marques (sax alto), Paulo Bernardino (clarinete baixo), André Fernandes (guitarra), Óscar Graça (piano) e Demian Cabaud (contrabaixo). Num registo jazz mais típico, o septeto trabalhou as composições originais do líder baterista com energia: o trio de sopros (Mortágua, Marques e Bernardino) liderava, guitarra e piano, lançavam ideias, contrabaixo e bateria puxavam pelo ritmo. O grupo mostrou um jazz enérgico.
A sessão da noite abriu com uma estreia, o quarteto ENTER THE sQUIGG. Liderado pelo guitarrista Mané Fernandes (aqui na guitarra elétrica, eletrónica e composição), este grupo junta o português João Barradas (acordeão MIDI) com o contrabaixista italiano Luca Curcio e o baterista dinamarquês Simon Albertsen. O quarteto exibiu a sua música original, marcada pelas sonoridades eletrónicas e por um groove constante. A combinação de guitarra (com som altamente processado pelos pedais) e acordeão MIDI resultava numa mescla de eletrónicas que por vezes até se confundiam; a dupla internacional acrescentava outra dimensão, sempre com balanço. Para março de 2022 está prometido o disco de estreia deste projeto, a ser editado pela Clean Feed. Venha ele, que por esta amostra promete muito.
Seguiu-se a cerimónia de entrega dos Prémios RTP / Festa do Jazz 2021, com apresentação de Carlos Martins (Sons da Lusofonia / Festa do Jazz) e João Almeida (RTP / Antena 2). Como “Grupo Revelação” foi distinguido o quarteto Garfo (disco homónimo editado este ano pela Clean Feed); o prémio “Artista Revelação” foi atribuído a Nazaré da Silva (cantora e compositora que este ano editou o seu disco de estreia Gingko); o ensemble Two Maybe More de Pedro Moreira ganhou o prémio de “Grupo do Ano”; o galardão de “Artista do Ano” foi entregue a Susana Santos Silva (que este ano editou os disco Tomorrow em duo com Torbjorn Zetterberg e integrou o quarteto Hearth que publicou o disco Melt); e o “Prémio Mérito” foi atribuído a Ivo Martins, programador do festival Guimarães Jazz.
A noite de sábado fechou com a atuação de novo projeto, chamado FOCA. O grupo junta André Fernandes na guitarra, Mário Laginha no piano, José Pedro Coelho no saxofone, João Hasselberg na eletrónica e baixo elétrico e João Pereira na bateria. Verdadeiro grupo all-star que cruza diferentes gerações, o quinteto mostrou uma música criativa e pujante. As electrónicas de Hasselberg marcavam a diferença e individualmente cada elemento acrescentava qualidade técnica; daqui resultava um jazz aceso.
A festa continuou na tarde de domingo, com concertos de HUH! (projeto de Bruno Ramos, Guilherme Rodrigues, Miguel Gonzalez e Zé Maria, programado por Pedro Melo Alves) e Garfo (quarteto de Bernardo Tinoco, João Almeida, João Fragoso e João Sousa), que na noite anterior tinham recebido o Prémio de Grupo Revelação; à noite actuaram César Cardoso com o seu ensemble Dice of Tenors; e a Festa fechou com a actuação do Sara Serpa Trio, com Ingrid Lubrock e Demian Cabaud – concertos aos quais infelizmente não tivermos possibilidade de assistir. Foi mais uma grande Festa do Jazz, que voltou a revelar talentos e a reunir diferentes gerações. A sua programação atenta tem refletido a evolução e crescimento do jazz nacional, bem como a cada vez maior diversidade estética.