Que Jazz É Este apresenta-se

O festival Que Jazz É Este? realiza-se em Viseu e chega este ano à sua 8.ª edição. Numa pequena entrevista, Ana Bento (organização) apresenta o festival.

Podem fazer uma apresentação o festival? Principais destaques?
O festival Que Jazz É Este? é um festival apoiado pelo programa Viseu Cultura do Município de Viseu e conta com outros importantes parceiros locais. O Que Jazz É Este? apresenta-se este ano na sua 8ª. edição e assenta desde a sua génese em 3 grandes pilares fundamentais: a oferta eclética e de qualidade de concertos com foco especial no jazz (no sentido mais amplo possível); a criação de dinâmicas e oportunidades quer de formação e profissionalização na área da música, assim como experiências educativas para público em geral; o desafiar novos públicos e ir ao encontro de públicos que pelas mais variadas razões estão impedidos de virem ao encontro do festival. É difícil fazer destaques quando a programação é tão vasta e diversificada por isso destacamos a estrutura que os vários dias do festival têm e cujos conteúdos específicos podem ser consultados de forma detalhada no site oficial (quejazzeeste.com): Rádio Rossio ao vivo a partir das 10h da manhã na Praça da República com 3 programas por dia, uma oficina para Famílias que decorre também às 10h na Casa do Miradouro, Jazz na Rua com partida do Rossio às 11h, um concerto às 19h (ora no jardim da Casa do Miradouro, ora num jardim junto ao Carmo81) e um concerto às 21h30 (o primeiro que decorreu no adro da Sé, agora acontece no Parque Aqulino Ribeiro e, no último dia, no Teatro Viriato). Desde as maiores e incontornáveis figuras do jazz português como Carlos Bica ou Mário Laginha, à fortíssima nova geração de músicos portugueses como João Guimarães ou Miguel Rodrigues, aos projectos mais experimentais Krake e Uhai ou nos limites mais amplos do jazz que tocam outros géneros como rock/pop (Whosputo) ou metal (Trolls Toy)…

Como fizeram a adaptação do programa, com os constrangimentos da pandemia?
A estrutura do festival foi redesenhada. Os habituais 5 dias consecutivos passaram a estar distribuídos entre 22 de julho e 30 de setembro (sempre às quartas feiras), as várias iniciativas foram programadas para vários locais de forma em vez de haver um local como foco principal (o que aconteceu nas edições anteriores no Parque Aquilino RIbeiro), houve uma estreita comunicação com a Protecção Civil local no planeamento das várias actividades, a equipa de produção e acolhimento de público foi reforçada.

Que ensinamentos vão levar desta edição para o próximo ano?
Essencialmente que vale a pena o esforço de levarmos as nossas vidas para a frente, de procurarmos alternativas para tornarmos as coisas possíveis, ainda que em formatos diferentes do que consideramos ideal. Ou em escalas muito mais pequenas que o habitual. É importante encontrarmos um equilíbrio do sermos responsáveis e zelarmos pela segurança de cada um e da comunidade em geral com o fazer acontecer e criar e alimentar as dinâmicas e práticas culturais e artísticas.

Livro: “Women In Jazz”

Women In Jazz: The women, the legends & their fight
Sammy Stein
(8th House Publishing, 2019)

As questões de igualdade de género começaram nos últimos anos a invadir os mais diversos espectros da sociedade, incluindo as artes e a cultura. O jazz não é excepção e esta é uma área especialmente rica para o debate. Sendo um mundo tradicionalmente masculino, historicamente no jazz o papel das mulheres esteve quase exlusivamente reservado para a voz – além de cantoras, são muito poucas as referências históricas femininas. Apesar de estarmos a viver uma evolução e de, nas décadas recentes terem surgido diversas mulheres instrumentistas que se distinguiram e afirmaram, ainda há festivais e salas que apresentam programações quase exclusivamente masculinas.

Com este novo livro, Women In Jazz: The women, the legends & their fight, a autora Sammy Stein explora a desigualdade de género neste universo musical. Grosso modo, o livro divide-se em duas partes: passado e presente. Na primeira metade a autora apresenta um conjunto de referências importantes do passado, com as inevitáveis cantoras populares (Billie Holiday, Ella Fitzgerald ou Nina Simone, entre outras), mas inclui também instrumentistas notáveis que não chegaram a alcançar o merecido reconhecimento público – como Melba Liston e Hazel Scott. Stein traça o percurso biográfico de cada uma destas figuras, referindo também circunstâncias em que as questões de género condicionaram as suas carreiras.

No segundo grande bloco do livro a autora olha para o presente, colocando diversas questões. A ausência de referências e “role models”, a forma como a educação e as escolas condicionam a aprendizagem e escolhas de percurso, a necessidade de ter de trabalhar mais e de mostrar mais do que um homem, questões de misoginia, sexualidade, violência e abuso são alguns dos temas referidos. Para esta abordagem a autora reúne um conjunto de entrevistas a compositoras, instrumentistas e cantoras da actualidade, participando nomes como Jane Ira Bloom, Terri Lyne Carrington, Kim Cypher, Barb Jungr e Carmela Rappazzo, entre outras. São ainda entrevistadas mulheres ligadas ao negócio da música, como agentes, promotoras, jornalistas e divulgadoras.

Embora o olhar para o passado seja relevante, essa retrospectiva histórica acaba por não acrescentar muito àquilo que os fãs já conheciam. A grande mais valia deste livro é mesmo a segunda metade, a abordagem do presente, cruzando questões e respostas, colocando diversas ideias em perspectiva. A autora expõe as ideias das intervenientes que estão no centro de tudo e, sem apresentar soluções mágicas, lança diversas pistas importantes para promover o pensamento crítico e uma discussão rica.

Em 2020 há diversos projectos jazzísticos (no mundo e também em Portugal) liderados por mulheres que merecem reconhecimento e exposição. Começam também a surgir iniciativas para a promoção da igualdade: o colectivo artístico We Have Voice de Nova Iorque (que inclui a portuguesa Sara Serpa) tem o objectivo de alertar, sensibilizar e actuar contra o assédio sexual e a discriminação; em Portugal surgiu no início deste ano a página de Facebook Mulheres do Jazz (da autoria de Beatriz Nunes, Joana Machado, Andreia Nunes e Joana Espadinha) dedicada a divulgar o jazz no feminino, as mulheres no Jazz, em Portugal e no mundo – mais um passo para promover a igualdade. A mudança está a fazer-se devagar, mas está a acontecer.

Ao vivo: Coreto | Jazz 2020


[© Fundação Calouste Gulbenkian – Vera Marmelo]

Com a pandemia covid-19, a Fundação Calouste Gulbenkian cancelou a realização da prevista 37ª edição do Jazz em Agosto, mas não esqueceu o jazz. O anfiteatro ao ar livre da Gulbenkian deu palco a um festival exclusivamente dedicado a músicos nacionais, Jazz 2020, com um programa que reflecte a diversidade do jazz e da música improvisada de Portugal. Além dos concertos na Gulbenkian, o novo festival apresentou concertos em Coimbra e também no Porto.

O festival abriu na Gulbenkian com a actuação do Coreto, colectivo portuense que tem marcado o jazz nacionais nos últimos anos, tendo editado discos notáveis como Aljamia (2012), Mergulho (2014) e Analog (2017). Comandado por João Pedro Brandão, também impulsionador da Associação Porta-Jazz, este é um ensemble de média/grande dimensão que junta quatro saxofones (Brandão, José Pedro Coelho, Rui Teixeira e Hugo Ciríaco), dois trompetes (Susana Santos Silva e Ricardo Formoso), dois trombones (Daniel Dias e Andreia Santos), guitarra (AP), piano (Hugo Raro), contrabaixo (José Carlos Barbosa) e bateria (José Marrucho).

O alinhamento do concerto passou sobretudo por temas já gravados em disco: “Raiz”, “Sob escuta”, “Radio”, “SOS”, “Transistor”, “Curto-circuito”. Para fechar a actuação ficou reservado um tema inédito, “Born Into Nature”. O Coreto trabalha um jazz complexo e vibrante, assente na qualidade das composições e na pujança da interpretação com o envolvimento colectivo. Destacaram-se alguns momentos a solo, como o extraordinário solo de Susana Santos Silva no trompete (“Sob Escuta”), um momento de José Carlos Barbosa trabalhando o contrabaixo com arco, em registo de câmara (“SOS”); e um solo enérgico de Daniel Dias (“Curto-circuito”).

Depois deste magnífico arranque com o Coreto, o festival Jazz 2020 continuou depois na Gulbenkian com actuações de Susana Santos Silva Impermanence, Angélica Salvi, The Selva, Daniel Bernardes & Drumming GP, João Lencastre Parallel Realities, Lantana e João Mortágua. Em Coimbra a Casa das Artes Bissaya Barreto acolheu concertos dos trios Luís Vicente, Hugo Antunes e Pedro Melo Alves e TGB. No Porto a Sala Porta Jazz recebeu as actuações do quarteto Ricardo Toscano, Rodrigo Pinheiro, Miguel Mira e Gabriel Ferrandini e do André Rosinha Trio.

Festa do Jazz 2020: programa completo

Angelica Salvi [© Fundação Calouste Gulbenkian – Vera Marmelo]


Já eram conhecidas as datas (12 e 13 de Setembro), agora acaba de ser apresentada a programação completa da 18ª edição da Festa do Jazz. A festa realiza-se no Pequeno Auditório do Centro Cultural de Belém e não terá público presencial, com os concertos a serem transmitidos em direto e todos os conteúdos estarão disponíveis na plataforma RTP Palco. O programa inclui actuações de Tomás Marques Quarteto, quarteto Carlos Martins / João Paulo Esteves da Silva / Carlos Bica / João Lobo, Homenagem a Bernardo Sassetti (com João Mortágua, João Pedro Coelho, Carlos Barretto e Alexandre Frazão), Andy Sheppard Quarteto, Gabriel Ferrandini Volúpias (com Rodrigo Pinheiro), João Barradas (solo), Angelica Salvi & Susana Santos Silva, novo trio de Ricardo Toscano (com Demian Cabaud e Marcos Cavaleiro) e Maria João & Carlos Bica. Além dos concertos, a programação da festa inclui o habitual encontro de escolas de jazz e ainda o lançamento do novo “Livro Festa do Jazz”, com presença de José Dias, Gonçalo Frota e Carlos Martins (um livro que conta a história da Festa do Jazz e traça o perfil de alguns dos intervenientes), e o debate “Portugal, Jazz e a questão racial” com Mamadou Ba (SOS Racismo), Maria João e Selma Uamasse.

Prémios PLAY: João Mortágua vence Melhor Álbum Jazz

A cerimónia de entrega dos prémios PLAY – Prémios da Música Portuguesa realizou-se no dia 29 de julho, no Coliseu dos Recreios, com transmissão na RTP1. Pela primeira vez foi atribuído um prémio na categoria jazz: Melhor Álbum Jazz. Para esta categoria foram nomeados quatro discos nacionais: Liturgy of Birds, de Daniel Bernardes & Drumming GP, Dentro da Janela, de João Mortágua, Histórias do Jazz em Portugal, de André Sousa Machado, e Ocre, de Filipe Raposo. O Comité do Jazz, constituído por quatro críticos e investigadores, distinguiu o disco Dentro da Janela de João Mortágua. Numa declaração exclusiva, o saxofonista afirma: “Receber este prémio é obviamente para mim uma grande alegria, mas representa também um importante passo para o jazz e a música improvisada. A meu ver, este nosso mundo traduz-se um género que há muito merece o devido destaque. Desejo muito que o Jazz, seja lá o que for agora ou venha ainda a ser daqui em diante, marque sempre presença no espaço Mediático. É já um facto que há entre nós excelentes compositores e improvisadores: dêem-nos voz, que nós cantaremos de pulmões bem abertos. E decerto o público se aperceberá que o que fazemos não cabe sequer na palavra jazz, e é tão livre e plural como o universo.Este prémio é também dos restantes nomeados, e de todos os músicos e estudantes de jazz do nosso país.”