O livro “Mas é Bonito” – “But Beautiful” no título original – é apresentado como “um livro sobre jazz”. E é verdade. O autor Geoff Dyer apresenta um conjunto de textos sobre figuras centrais da história do jazz: Lester Young, Thelonious Monk, Bud Powell, Ben Webster, Charles Mingus, Chet Baker e Art Pepper (selecção curiosa, evitando nomes óbvios). Os textos sobre cada um dos músicos são intermediados por diálogos entre Duke Ellington e Harry Carney, numa longa viagem entre concertos.
Ao longo do livro Dyer desenvolve textos breves, ficcionados a partir de momentos/histórias reais, sobretudo tendo por base fotografias icónicas e histórias conhecidas. Os textos são desenvolvidos com criatividade, pontuados por emoção, fazendo sempre uma ligação entre momentos da vida pessoal de cada músico e as características da própria música de cada um dos intervenientes.
A leitura é fácil e agradável e, além de desvendar episódios pessoais, tem como principal ponto positivo a capacidade de despertar a curiosidade sobre as músicas – o mais importante. As críticas estampadas na contracapa referem que este será “provavelmente o melhor livro que alguma vez se escreveu sobre jazz”. Claro exagero, tendo em conta a produção literária que vem sendo desenvolvida, mas não deixa de ser um objecto simpático.
Contudo apesar do tom agradável que caracteriza a maior parte da obra, o livro fecha num tom dissonante, com o acrescento de um posfácio desnecessário com o título “Tradição, Influência e Inovação”. Para encerrar, o autor apresenta ensaio-crítica sobre a história do jazz, partindo de uma análise social/histórica numa perspectiva pessoal – e muito superficial. Infelizmente, além de nada acrescentar à boa dinâmica literária, serve-se de factos errados para alimentar e condicionar uma linha de pensamento.
Entre as várias ideias questionáveis, refere-se à enérgica fase final de Coltrane como “esgotamento criativo”, faz uma ligação directa entre a ascensão do free jazz ao declínio de vendas de discos – factualmente errado, o jazz já há muito que tinha perdido as vendas, desde a afirmação do rock como música popular. Lamentável é também ignorar a contínua evolução da história do jazz, fazendo apenas uma breve referência aos anos 1980s para assinalar o ressurgimento do hardbop. É uma pena que o autor tenha acrescentado este posfácio, porque de resto se trata de um objecto literário aprazível, bem estruturado e desenvolvido.
Nota sobre a tradução:
A tradução para português foi realizada por Bruno Vieira Amaral. Não li o original para uma análise aprofundada, mas percebe-se que o trabalho de tradução de uma obra destas não será tarefa fácil, não só pela diversidade termos técnicos musicais, sobretudo pelas expressões características da cena jazzística. Contudo o maior problema – e mais visível – é mesmo o título do livro. “But Beautiful” é também o título de uma canção, standard intemporal, e seria difícil encontrar uma equivalência perfeita em português. Não seria um daqueles casos (raros) em que se poderia deixar o original, compensado com o subtítulo explicativo?