O trompetista Luís Vicente já se afirmou como um dos mais internacionais músicos portugueses da sua geração. Músico com um percurso vasto, tem actuado pela Europa fora, tem alimentado colaborações com diversos músicos estrangeiros e tem acumulado gravações que documentam as mais diversas parcerias. Se é verdade que a música improvisação livre tem vivido tempos particularmente ricos em Portugal, Vicente consegue destacar-se como um dos mais notáveis improvisadores, exibindo técnica e versatilidade. Editou em 2012 o seu disco de estreia como líder, “Outeiro”, e tem colaborado em projectos como Clocks & Clouds, Fail Better!, Twenty One 4tet , Dikeman/Vicente/Antunes/Ferrandini, In Layers, Deux Maisons e What About Sam?, entre outros projectos e participações em grupos ad-hoc. Acabando de editar quatro discos novos, o trompete de Luís Vicente mostra-se imparável.
O Frame Trio junta o trompete de Luís Vicente com a guitarra do português Marcelo dos Reis e o contrabaixo do holandês Nils Vermeulen. Neste seu disco de estreia – “Luminária”, edição da inglesa FMR Records – o trio apresenta uma música assente na improvisação aberta, trabalhando no equilíbrio entre os sons das cordas e o ar do trompete. Assistimos a um diálogo elegante, quase de câmara, entre os três instrumentos, que por vezes surpreendem pela utilização de técnicas extensivas, arrancando sons estranhos de cada um. A guitarra assume um papel central, o contrabaixo mais secundário, o trompete destaca-se também. O resultado global é muito interessante, uma música aberta, criativa e dialogante.
Também no formato trio, com Yedo Gibson e Vasco Trilla, Luís Vicente acaba de editar o álbum “L3” (edição Multikulti). Vicente conta alia-se a Yedo Gibson (saxofones soprano e tenor) e Vasco Trilla (bateria e percussão) para uma música que surpreende. Os sopros de Vicente e Gibson evitam melodias, e mesmo notas, os dois músicos servem-se dos instrumentos para explorarem ruídos, assobios, sons não convencionais, desafiando permanentemente o ouvinte. Na percussão, Trilla desenvolve uma manta de percussão que complementa o trabalho dos sopros. Este trio diabólico apresenta uma música inquietante, originalíssima.
Também em formato trio, chega o disco “Live In Ljubljana” (também edição Multikulti), gravado pelo grupo Luís Vicente / Seppe Gebruers / Onno Govaert. Ao trompete de Vicente junta-se o piano do belga Seppe Gebruers e a bateria do holandês Onno Govaert (também parceiro do trompetista no quarteto In Layers). Este disco documenta uma actuação ao vivo do trio em Ljubljana, no centro cultural Španski Borci (que dá o título aos temas, separados por numeração). O trio explora um total de três temas, começando num ambiente de pesquisa, com o trio a lançar sugestões individuais, que se vão entrelaçando. A presença do piano, como elemento central, acrescenta uma elegância quase camarística. A percussão está muito presente, por vezes deixa-se ficar na sombra, mas muitas vezes reclama atenção. E o trompete, explorado de diversas formas, assume protagonismo, atravessando ambientes sonoros. Daqui resulta um diálogo em toada morna, sem rebentar.
Num contexto diferente, afastado do formato trio, chega o disco “Music From Any Moment”, gravado pelo grupo Zwerv. Publicado pela editora portuguesa Creative Sources, este disco junta o trompete de Vicente com uma grande trupe internacional: Ziv Taubenfeld (clarinete baixo), Salvoandrea Lucifera (trombone), Henk Zwerver (guitarra), Nico Chientaroli (piano), Raoul van der Weide (contrabaixo, objectos) e George Hadow (bateria). Gravado na sala Zaal 100, em Amesterdão, este disco expõe, ao longo de oito faixas, o septeto a desenvolver uma improvisação mais abstracta. Começamos por ouvir pequenos apontamentos individuais, onde importa menos o detalhe, sobressaindo a massa comum; ao contrário dos discos anteriores, o espaço para o “voicing” individual é mais limitado, o destaque vai para as camadas que se vão sobrepondo, sempre numa controlada turbulência.