Ricardo Toscano & Gabriel Ferrandini: diálogo e confronto

Entre Outubro de 2018 e Abril deste ano o bar Irreal, em Lisboa, contou com programação de Gabriel Ferrandini e Pedro Sousa. Uma das noites mais memoráveis aconteceu com a actuação de um quarteto que juntou Ricardo Toscano (saxofone alto), Gabriel Ferrandini (bateria), Rodrigo Pinheiro (piano) e Miguel Mira (violoncelo). Depois desse concerto o quarteto foi convidado para integrar a programação do festival Jazz em Agosto. A partir daí Toscano continuou a explorar a improvisação livre e integrou um outro quarteto, com Rodrigo Amado, Hernâni Faustino e João Lencastre. Agora, Toscano e Ferrandini vão actuar juntos, vão estrear-se no formato duo, num concerto na Galeria ZDB no dia 10 de Maio. Dois dos mais exuberantes músicos portugueses da nova geração, Toscano e Ferrandini antecipam esse concerto.

Como é que nasceu a ideia de tocarem juntos?

GF: A cena do “jazz life” é que o pessoal está sempre a picar-se uns aos outros, há sempre aquela vontade de tocar e experimentar coisas com toda a gente. Claro que há pessoas que te motivam mais do que outras, com quem podes estar mais curioso. Quando tínhamos o Irreal nas mãos, eu e o Pedro [Sousa] conseguimos desafiar algumas pessoas para tocar lá e o Ricardo foi uma delas. Houve a oportunidade de tocarmos num quarteto: eu, o Ricardo, o Rodrigo Pinheiro e o Miguel Mira. Foi um primeiro encontro e a sensação foi muito boa. Vamos agora ter outro concerto com este quarteto [no Jazz em Agosto], mas entretanto tinha falado com o Ricardo que era fixe fazermos mais alguma coisa até lá. Em conversa com o Sérgio [Hydalgo, da ZDB] dei a dica de fazermos um duo. São só dois músicos, tem aquela coisa mais despida e ao mesmo tempo tem aquela coisa de confronto, de diálogo, não tens o apoio de um trio ou quarteto… O Sérgio ficou motivado e disse “claro que sim”. E o Ricardo também achou grande onda.

Ricardo, ao aceitares o convite para tocar nesse grupo de improvisação livre acabaste por sair da tua “zona de conforto”. Como encaraste este desafio?

RT: Acabou por ser natural. Apesar de a música ser diferente, a atitude acaba por ser a mesma: é tentar, é o “go!”, é o “bora”, agora é que interessa. Acho que isso acaba por ser a nossa linguagem comum. Acho que a energia é a mesma, é essa do “go, bora aí”. Seja a tocar standards, seja a tocar improvisação livre…

Aqui estás a explorar outra linguagem, para ti tem sido também uma aprendizagem. Como tens lidado com essa evolução?

RT: Será que quando estou mais exposto a essa forma de tocar será que estou mais conectado ao meu instrumento? Quando estou a tocar com o meu quarteto serei menos confrontado com esses momentos de reagir, de encontrar uma coisa nova que não conhecia, de encontrar uma nova forma de expressão no meu instrumento… Ultimamente, não sei se é influência daquilo que tenho feito, isso acontece, isso é uma realidade. É por isso que eu estou a dizer que eu vejo a coisa da mesma forma, estou sempre a tentar, estou sempre a tentar reagir, a ver o que posso fazer com isto, sempre a espicaçar a malta com quem toco… Acho que é isso que temos em comum, para o duo e também no quarteto.

GF: Há coisas que se trazem à mesa que na verdade não são os teus problemas, são problemas antigos. Dantes havia mais “velhos do Restelo”, mais fricção, menos abertura. Se calhar para algumas pessoas não faz sentido ver-nos a tocar juntos, para nós é uma cena super natural. Há montes de coisas que vêm de universos diferentes mas há muito mais em comum, há muito mais coisas partilhadas. Lembro-me que quando comecei havia muito mais barreiras, se tu de forma natural consegues dizer que não há barreiras, há essa responsabilidade de dizeres “bora aí”, que se lixem os velhotes, que se lixem as barreiras.

RT: Ao mesmo tempo é uma oportunidade. Sempre que vais ao palco tens uma responsabilidade, tens que garantir qualquer coisa, a malta vai ouvir-te porque sabe que fazes uma coisa mais ou menos bem, seja num estilo ou no outro. Ali temos uma coisa em comum e temos uma oportunidade de fazermos uma coisa juntos, há oportunidade de ouvirem uma coisa que nunca ouviram.

Ao vivo: Amaro Freitas Trio em Oeiras

Texto e fotografia: Carla Guedes Pinto

O pianista revelação Amaro Freitas apresentou com o seu trio, no passado dia 30 de Abril, Dia Internacional do Jazz, o concerto onde reúne temas dos dois álbuns “Sangue Negro” (2016) e “Rasif” (2018), no Auditório Eunice Muñoz em Oeiras.

Amaro Freitas recebe-nos ao piano como um prelúdio do que se vai passar, um convite ao ambiente acústico da sua raiz nordestina, com sons e percussões retirados directamente das cordas do piano, vibrações e silêncios que nos conduzem neste início de viagem à sua essência cultural.

Já com o trio formado, com Hugo Medeiros (bateria) e Jean Elton (baixo acústico) Amaro Freitas apresenta-nos temas dos seus dois álbuns, sempre numa composição rítmica fortíssima, uma energia e generosidade, para um auditório infelizmente com pouco público.

A ligação que tem ao seu lugar de origem, Pernambuco revela-se logo no título do álbum, “Rasif”, uma analogia ao nome da sua cidade natal, Recife. Amaro Freitas parte dos ritmos locais, como o frevo e o coco para criar um jazz que confere em simultâneo uma forte raiz popular e espiritual.

Ao longo das várias intervenções que faz com o público, sempre de grande generosidade, simplicidade e simpatia, Amaro Freitas explica-nos a raiz das composições rítmicas, como no tema Trupé, que parte da sua observação do coco trupé da cidade de Arcoverde “onde se dança com sandália de madeira sobre um tablado”.

A ligação entre os músicos é natural ao longo de todo o concerto, com temas longos e de exigência interpretativa, percebe-se o envolvimento emocional e o virtuosismo que cada um impõe à música. Todos os instrumentos são usados como percussões, retirando deles sons de diferentes texturas e ritmos orgânicos.

Perfeita conjugação de ritmos afro-brasileiros, de uma criatividade longe de um brasil samba bossa-nova, mas perto de uma espiritualidade popular, de um lugar de natureza dura, telúrica mas fértil. Freitas representa o novo jazz brasileiro, dançante, criativo e experimental, mas ao mesmo tempo assente na tradição popular.

Segundo/Stanley ao vivo no CCB

O baterista Pedro Segundo, músico português a viver entre Londres e os EUA, vai apresentar no Centro Cultural de Belém o seu duo com com o organista Ross Stanley. O Segundo Stanley Hammond Organ Duo apresenta-se ao vivo no dia 4 de Maio, às 21h00, no Pequeno Auditório. O valor dos bilhetes varia entre 14€ (plateia) e 12€ (laterais).

Esdras Nogueira recria álbum “Transa” de Caetano Veloso

Em 1972 Caetano Veloso apresentou ao mundo o álbum “Transa”, uma das pérolas mais brilhantes da sua enorme discografia, composto e gravado durante o seu exílio em Londres por altura da ditadura militar. Agora, novamente num momento de enorme tensão política no Brasil, o saxofonista brasileiro Esdras Nogueira acaba de apresentar uma recriação desse álbum histórico. O novo “Transe” de Nogueira é uma transformação jazzística da música de Caetano, onde estão incluídos temas como “You Don’t Know Me”, “Nine Out of Ten”, “Triste Bahia” e “Mora na Filosofia”. Neste projecto o saxofone barítono de Esdras Nogueira conta com a parceria da guitarra de Marcus Moraes, do baixo de Rodrigo Balduino e da bateria de Thiago Cunha.

The Necks ao vivo em Braga e Lisboa

O grupo australiano The Necks vai apresentar-se ao vivo em Portugal, com concertos no gnration em Braga (15 de Maio) e na Culturgest em Lisboa (16 de Maio). Com o recente disco “Body” (2018) na bagagem, a banda de Tony Buck, Chris Abrahams e Lloyd Swanton aproveita também para celebrar os seus 30 anos de carreira. Braga e Lisboa vão assistir ao vivo à música original do trio, um jazz combinado com minimalismo e fluência improvisacional.

Isabel Rato apresenta “Histórias do Céu e da Terra”

[Fotografia: Joana Soda]

A pianista e compositora Isabel Rato acaba de lançar o seu novo disco, “Histórias do Céu e da Terra”. O novo material será apresentado ao vivo em concertos em Lisboa (1 e 2 de Maio no Hot Clube), no Porto (4 de Maio na Casa da Música) e em Setúbal (25 de Maio na Casa da Cultura). O novo álbum dá seguimento ao disco de estreia da pianista, “Para Além da Curva da Estrada”, editado no ano de 2016. Numa entrevista breve, Isabel Rato apresenta-nos este novo trabalho.

 

Que novidades tem este disco?
Este disco tem nova música, minha e de compositores que fazem parte da minha vida, como Luís Barrigas e João Rato. Este disco procura cada vez mais a união da música portuguesa com a música improvisada. Tem muitas canções desta vez… Reflecte a minha vontade de querer continuar a escrever e compor música, fazer arranjos para todos os instrumentos, mas também uma enorme necessidade de liberdade e espaço para a improvisação. Este disco tem vários convidados que muito admiro e também um quinteto de base. Todos estes músicos levam a minha música como se fosse deles, com a enorme mestria e talento que lhes assiste. Há mais novidades entretanto…

Quem são os músicos que participam? 
Começo pelo quinteto: João David Almeida na voz; João Capinha nos saxofones soprano, alto e tenor; João Custódio no contrabaixo; Alexandre Alves na bateria. Os músicos convidados: Beatriz Nunes na voz; Elisa Rodrigues na voz e autora da letra do “Vem”; João Barradas no acordeão e João Rato na guitarra. O quarteto de cordas é o “Quarteto Arabesco”: Denys Stetsenko no violino, Raquel Cravino no violino; Lúcio Studer na viola; Ana Raquel Pinheiro no violoncelo. E o disco foi misturado e masterizado pelo Nelson Carvalho.

Que ideias pretendes transmitir com esta música?
Penso que a música portuguesa, a palavra, e os nossos sons tradicionais são muito ricos… E quero continuar a desenvolver essa união com a música improvisada, como já tinha feito também no 1º disco. Procuro também não pensar, apenas deixar a música fluir e simplesmente acontecer em comunhão com o grupo…

Campo de Ourique também celebra o jazz

O Dia Internacional do Jazz também vai ser celebrado no Mercado de Campo de Ourique, em Lisboa. Assinalado a efeméride, a produtora Out of the Blue apresenta um concerto com a banda The Invisible Tuba no dia 30 de Abril, às 21h00. Este projecto junta o trompetista anglo-sardenho Mattia Corda e Simone Carugati no banjo, definindo-se como uma banda de jazz tradicional ao estilo de New Orleans.

Disco: “In Search of Light” de Eduardo Cardinho

Eduardo Cardinho 
“In Search of Light” 
(Nischo, 2019)

É raro vermos o vibrafone a assumir o papel de líder na história do jazz. Eduardo Cardinho é uma honrosa excepção lusitana que, ainda jovem, começa a dar que falar. Natural de Leiria, estudou na ESMAE, foi aluno de Jeffery Davis (nasceu no Canadá e tornou-se referência nacional no instrumento), tem estado ligado à cena jazz portuense e em 2014 recebeu a distinção de melhor instrumentista na Festa do Jazz do São Luiz. O seu disco de estreia como líder, Black Hole, surgiu em 2016, editado pelo Carimbo Porta-Jazz. Esse álbum mostrava um excelente instrumentista e compositor com vontade de se afirmar e com ideias próprias. Desde então temos visto Cardinho a evoluir, emprestando o seu vibrafone a diversos projectos, como os excelentes Home de João Barradas e o quinteto Galip, e foi convidado da Orquestra Jazz de Matosinhos no seu ciclo “Novos Talentos”. Chega agora o seu segundo disco como líder, desta vez publicado pela editora Nischo. (…)

Texto completo no no jornal Público:
https://www.publico.pt/2019/04/26/culturaipsilon/critica/procurando-luz-1870368

Pedro Melo Alves apresenta novo in igma

[Fotografia: Márcia Lessa]

O baterista, compositor e improvisador Pedro Melo Alves prepara-se para apresentar ao vivo o seu novo projecto chamado in igma. Esta nova aventura musical surgiu de uma encomenda do programador Rui Eduardo Paes para o festival Jazz no Parque e Melo Alves promete aprofundar a “pesquisa pela música erudita contemporânea aliada às práticas da improvisação”. Neste grupo o baterista Pedro Melo Alves conta com o apoio de um grupo de músicos oriundos de diferentes universos: Aubrey Johnson (voz), Beatriz Nunes (voz), Mariana Dionísio (voz), Eve Risser (piano), Mark Dresser (contrabaixo) e Abdul Moîmeme (guitarra eléctrica preparada). Além da actuação no Jazz no Parque de Serralves (6 de Julho), o grupo apresenta-se ao vivo no Südtirol Jazz Festival em Itália (5 de Julho), no Salão Brazil em Coimbra (11 de Julho) e no Hot Clube de Portugal (12 e 13 de Julho).

Out Jazz 2019: programa completo

Aqui está a programação completa do Out Jazz 2019. Os concertos realizam-se sempre aos domingos à tarde (17h00) em cinco jardins de Lisboa. Mais uma vez, é de lamentar que a programação se afaste do jazz, substituída por groove, soul e funk. É pena que a nova geração criativa de jazz português, em plena fase de afirmação, passe ao lado deste cartaz, em favor de outras propostas que nada têm de jazz ou improvisação. Contudo, encontram-se no programa algumas propostas relevantes, como Samuel Lercher Trio, Jessica Pina, Hitchpop, André Carvalho, Centauri, Daniel Neto e Desidério Lázaro. Aqui fica o programa completo.